domingo, 14 de novembro de 2010

Morte de uma mulher negra

Embora lutando com a realidade de um ser humano, em vez de um mito, a mulher negra forte morreu. Autoridades médicas dizem que ela morreu de causas naturais, mas aqueles que a conheceram sabem:

Ela morreu por ficar em silêncio quando ela deveria ter gritado. De ter sorrido, quando ela deveria ter sido violenta. De estar doente e esconder, não querendo que ninguém soubesse, porque sua dor poderia incomodar os senhores e as senhoras.

Ela morreu de uma overdose de outra gente se agarrando a ela quando ela mesma não tinha sequer energia para si mesma.

Ela morreu de amor por homens que não a amam por só amarem a si mesmos e só poderem oferecer-lhes visitas furtivas na calada da noite.

Ela morreu de criar os filhos sozinha.

Ela morreu vítima das mentiras que sua avó contou à sua mãe e sua mãe lhe contou sobre a vida, homens e racismo ...

Ela morreu por ter sido abusada sexualmente quando criança e ter que tomar como natural essa verdade em todos os lugares que ela ia todos os dias da sua vida, barganhando a humilhação, pela culpa.

Ela morreu asfixiada, cuspindo o sangue dos segredos que ela continuava tentando queimar no seu coração, ao invés de se permitir ao tipo de colapso nervoso ao qual ela tinha direito, mas que reservado pelo sistema apenas para as meninas brancas ou mais claras, pois só para essas o estabelecimento pode pagar.

Ela morreu por ser responsável, porque ela era o último degrau da escada e não havia ninguém para quem ela podese repassar.

A mulher negra forte está morta ..

Ela morreu de ser uma mãe aos 15 anos e uma avó de 30 e um antepassado longinquo aos 45.

Ela morreu de tanto ser arrastado para baixo e por sentar-se com irmãs supostamente mais evoluídas posando como irmãs e amigas.

Ela morreu por tolerar um “seu Piedade”, apenas para ter um homem ao redor da casa.

Ela morreu de sacrificar-se por tudo e todos quando o que ela realmente queria era ser uma cantora, uma dançarina, uma professora, ou algo assim, igualmente magnífico.

Ela morreu de mentiras de omissão, porque ela não quis trazer o negro para baixo.

Ela morreu de homenagens de seus colegas que deveriam ter combinado seus esforços no foco da realidade dos guêtos, em vez de tomar a sua imagem e transformar em proselitismo rico em palavras mortas e canções vazias.

Ela morreu dos mitos que não lhe permitia mostrar fraqueza, sem ser castigada como preguiçosa e vadia....

Ela morreu de esconder seus verdadeiros sentimentos, até que tornou-se dura e amarga o suficiente para inundar seus seios, como os tumores e as ulcerações da raiva.

Ela morreu de sempre carregar coisas pesadas,entre caixas de geladeiras sozinha.

A forte mulher negra está morta ..

Ela morreu de nunca ser o bastante do que os homens queriam, ou sendo demais para os homens que ela queria.

Ela morreu por ser muito preta e morreu novamente por não ser suficientemente negra.

Ela morreu por ser mal informada sobre a sua mente, seu corpo e da medida de suas capacidades reais.

Ela morreu de joelhos pressionados ao solo, porque respeito nunca fez parte do que lhe estava sendo empurrado.

Ela morreu de solidão nas salas de parto e solidão nos centros clandestinos de aborto.

Ela morreu nos banheiros com as veias abertas, rebentada pelo auto-ódio, ajudada pela negligência.

E às vezes quando ela se recusou a morrer, quando ela simplesmente se recusou a se dar por morta, ela foi assasinada por imagens brancas de cabelos loiros, olhos azuis e bundas achatadas, importadas diretamente da mídia para a “inclusão social” dos novos ricos dos pagodes ou do futebol.

Às vezes, ela foi pisoteada até a morte pelo racismo e sexismo, executada pela ignorância high-tech, enquanto levava a família em sua barriga, a comunidade em sua cabeça, e a raça nas costas!

A mulher negra forte está morta!

... ... ou não?

Esta mensagem foi enviada pelo Dr. Runoko Rashid, em inglês, e traduzida pelo brasileiro Adelson Brito no blog O Negro Liberto.

sábado, 13 de novembro de 2010

A Todas as Mulheres Negras, de todos os Homens Negros


Rainha-Mãe-Filha da África
Irmã de minha alma
Noiva Negra da Minha Paixão
Meu Amor Eterno

Eu te saúdo, minha Rainha, não com a lamúria servil de um Escravo submisso à qual já te acostumaste, nem com a nova voz, as súplicas oleosas da lustrosa Burguesia Negra, nem com os gritos cruéis do grosseiro Escravo Livre – mas com minha própria voz, a voz do Homem Negro. E embora te saúde de outra maneira, minha saudação não é nova, mas tão velha quanto o Sol, a Lua e as Estrelas. E, ao invés de marcar um novo princípio, significa apenas a minha Volta.

Eu regressei dos mortos. E te falo neste momento do Aqui e Agora. Eu estava morto há quatrocentos anos. Durante quatrocentos anos tu tens sido uma mulher solitária, despojada do teu homem, uma mulher sem homem. Durante quatrocentos anos não fui nem teu homem nem meu próprio homem. O homem branco ficou entre nós, sobre nós, à nossa volta. O homem branco foi o teu homem e o meu homem.

Não te esqueças desta verdade, minha Rainha, pois mesmo que ela tenha incendiado a medula de nossos ossos e diluído nosso sangue, precisamos trazê-la à superfície da mente, ao domínio do conhecimento, fixando nosso olhar sobre ela como uma serpente enroscada nas barras do cercado de brincar de um bebê, ou como as flores frescas sobre o túmulo de uma mãe. Ela deve ser pesada e compreendida no coração, pois o salto da bota do homem branco é o nosso ponto de partida, nosso ponto de Decisão e Volta – o pivô salpicado de sangue do nosso futuro. (Mas eu te pediria para lembrar que, antes que pudéssemos sair da escravidão, tivemos de ser derrubados do nosso trono.)

Do outro lado do abismo estéril da masculinidade negada, de quatro centenas de anos sem minhas Bolas, vemo-nos hoje face a face, minha Rainha. Sinto uma profunda e horrível ferida, a dor da humilhação do guerreiro vencido. A vergonha do corredor exímio que tropeça na partida. Não tenho justificações.

Não posso suportar olhar os teus olhos. Tu não sabes (e certamente deve ter percebido gora: quatrocentos anos!) que durante quatrocentos anos fui incapaz de olhar diretamente os teus olhos? Estremeço por dentro sempre que me olhas. Posso sentir... no brilho dos teus olhos, de um lugar escondido bem lá no fundo, um segredo que guardas há muito tempo. Esta é a simples verdade. Não que eu me sentisse justificado, em tais circunstâncias, em tomar tais liberdades contigo, mas quero que saibas que eu tinha medo de olhar nos teus olhos porque sabia que ali encontraria refletida a Denúncia impiedosa da minha impotência e o irresistível desafio de reaver minha masculinidade conquistada.

Minha Rainha, é difícil para mim dizer-te o que hoje sinto no coração por ti – o que está no coração de todos os meus irmãos negros e de todas as tuas irmãs negras. E tenho medo de fracassar, a não ser que venhas a mim, sintonize-te em mim com a antena do teu amor, o amor sagrado em grau extremo que tu não me pudeste dar porque eu, estando morto, não mereceria recebê-lo; aquele amor de negro, perfeito e radical, com o qual nossos pais floresceram.

Deixa-me beber da fonte do rio do teu amor, deixa as cordas da força do teu amor amarrarem minha alma e cicatrizar as feridas da minha Castração, deixa meu exílio convexo terminar sua Odisséia assombrada na tua essência côncava, que recebe aquilo que pode dar. Flor da África, somente através do poder libertador do teu novo amor é que a minha masculinidade poderá ser resgatada. Pois é nos teus olhos, diante de ti, que minha necessidade deve ser justificada. Só, só, só tu e somente tu podes condenar-me ou deixar-me em liberdade.

Convence-te, Irmã Negra, que o passado não é um panorama proibido, algo para o qual não ousamos olhar com medo de sermos, como a esposa de Loth, transformados em estátuas de sal. Pelo contrário, o passado é um espelho onisciente: contemplamo-lo e nele vemos refletidos nós próprios e todos os outros – o que fomos, o que somos hoje, como ficamos desta maneira e o que estamos nos tornando. Negar-se a olhar para o Espelho do Antes, meu coração, é recusar contemplar a face do Agora.
Eu vivi a sétima vida do gato, encarei Satã e virei as costas a Deus, jantei no chiqueiro dos Porcos, e desci ao ponto mais profundo do Buraco, entrando no Covil e apanhando minhas Bolas de entre os dentes de um leão a rugir!

Beleza Negra, em silêncio impotente eu ouvi, como se fora uma sinfonia de lamentações, os teus gritos de socorro, os apelos angustiados e cheios de pavor que ainda ecoam em todo o Universo e por toda a mente, um milhão de gritos dispersos através dos anos de dor que se fundiram num único som de sofrimento para assombrar e sangrar a alma, um som incandescente para queimar o cérebro e ascender o estopim do pensamento, um som de presas e dentes para comer o coração, um som de fogo se alastrando, um som de gelo que queima, um som de chamas que devoram, um som ardente, um som de fogo para derreter o aço das minhas Bolas. Um som de Fogo Azul, um som Melancólico, um som de morte, um som da minha mulher em pranto, um som do sofrimento da minha mulher,O SOM DA MINHA MULHER CHAMANDO-ME, CHAMANDO-ME, EU OUVI O TEU GRITO DE SOCORRO, OUVI AQUELE SOM AFLITO MAS ABAIXEI A CABEÇA E NÃO DEI ATENÇÃO, OUVI O CHORO DA MINHA MULHER, OUVI O GRITO DA MINHA MULHER, OUVI MINHA MULHER IMPLORAR A PIEDADE DA BESTA POR MIM, OUVI-A IMPLORAR POR MIM, OUVI MINHA MULHER IMPLORAR A PIEDADE DA BESTA POR MIM, OUVI MINHA MULHER MORRER, OUVI O SOM DA TUA MORTE, UM SOM DE ESTALIDO, UM SOM QUEBRADO, UM SOM QUE SOAVA O FINAL, O ÚLTIMO SOM, O DERRADEIRO SOM, O SOM DA MORTE, EU, EU OUVI, EU O OUÇO TODOS OS DIAS, EU O OUÇO AGORA... EU TE OUÇO AGORA... EU TE OUÇO AGORA... EU TE OUÇO... Eu te ouvi então... o grito veio como um raio fulminante deixando um risco nas minhas costas negras. Num estupor covarde, com o coração palpitando e os joelhos tremendo, vi o chicote da morte do Escravizador cortar zunindo o ar e morder com dentes de fogo a sua carne delicada, a carne negra e macia das Mães Africanas, forçando a Vida a sair prematuramente do seu útero dilacerado e ultrajado, o útero sagrado que originou o primeiro homem, o útero que incubou a Etiópia, populou a Núbia e deu à luz os Faraós do Egito, o útero que pintou de preto o Congo e originou o Zulu, o útero de Méris, o útero do Nilo, do Níger, o útero de Songhay, do Mali, de Gana, o útero que senti o poder de Chaka antes de ele ter visto o Sul, o útero Sagrado, o útero que conheceu a forma futura de Jomo Kenyatta, o útero dos Maus-Maus, o útero dos Negros, o útero que nutriu Toussaint L’Ouverture, que aqueceu Nat Turner, Gabriel Prosser e Denmark Vesey, o útero negro que se entregou em lágrimas àquela corrente anônima e interminável da Nata da África, a Nata Negra da Terra, aquela corrente anônima e interminável que com fortes gemidos caiu no esquecimento do grande abismo, o útero que recebeu, alimentou e sustentou firme a semente e devolveu Sojourner Truth, a Irmã Tubman, Rosa Pparks, Bird e Richard Wright, e suas outras obras de arte que usaram e usam nomes tais como Marcus Garvey, DuBois, Kwane Nkrumah, Paul Robeson, Malcolm X e Robert Williams, e aquele que tu suportaste com sofrimento e que se chamou Elijah Muhammad, mas, acima de tudo, todos aqueles anônimos que eles te arrancaram do útero numa inundação de sangue de assassinatos que se espalhou e se infiltrou na lama. E Patrice Lumumba, Emmet Till e Mack Parker.

Oh, Minha Alma! Tornei-me um covarde lamuriento, um desgraçado medroso, um bajulador vil, com o meu desejo de oposição petrificada diante do temor cósmico do Senhor dos Escravos. Ao invés de instigar os Escravos à rebelião com uma oratória eloqüente, suavizei suas feridas e cantei com eloqüência o Blues. Ao invés de atirar minha vida cheia de desprezo na cara do meu Algoz, derramei o nosso precioso sangue! Quando Nat Turner procurou libertar-me do meu temor, esse mesmo Temor entregou-o ao Carniceiro – um monumento martirizado à minha Emasculação. Meu espírito era sem vontade; e minha carne, fraca. Ah, eterna ignomínia!

Eu, o Eunuco Negro, despojado de minhas Bolas, caminhei pela terra com a mente trancada num Frigorífico. Eu mataria um homem ou uma mulher negra mais rápido do que esmagaria uma mosca, enquanto colheria para o homem branco milhares de quilos de algodão por dia. Qual o lucro dos esforços cegos e exaltados dos (Culpados!) Eunucos Negros (Justiceiros!) que escondem suas feridas e menosprezam a verdade para mitigar sua culpabilidade através do pálido sofisma de postular uma Democracia Universal de Covardes, assinalando que na história ninguém pode esconder-se, que, se não numa época, então certamente em outra, o salto de ferro do Conquistador esmagou na lama as Bolas de Todos?

Memórias do ontem não mitigarão as torrentes de sangue que vertem hoje dos meus culhões. Sim, a História lembra um texto escarlate, com seus rabiscos e pontinhos impressos em vermelho com sangue humano. Mais exércitos do que os mostrados nos livros fincaram bandeiras em solo estrangeiro deixando a Castração no seu rastro. Mas nenhum escravo deve morrer de morte natural. Existe um ponto onde a Cautela termina e a Covardia principia. Enfiem-me uma bala no cérebro com a arma do opressor numa noite de sítio. Por que há dança e cantoria nos Bairros Escravos? Um Escravo que morre por causas naturais não pode se comparar a duas moscas mortas na Escala da Eternidade. Ao invés de ser pranteado, merece piedade.

A mulher negra, sem perguntar como, diz apenas que sobrevivemos à nossa marcha e trabalhamos forçados através do Vale da Escravidão, do Sofrimento e da Morte – ali, naquele Vale escondido bem abaixo de nós por uma névoa que se esvai. Ah, que visões, sons e sofrimentos estão por trás daquela névoa! E pensávamos que a dura escalada daquele vale cruel levava a algum lugar agradável, verde, pacífico e ensolarado! Mas aqui tudo é selva, uma região selvagem e bravia que transborda em ruínas.

Mas coloca tua coroa, Minha Rainha, e construiremos uma Nova Cidade sobre estas ruínas.

Eldridge Cleaver, ex-ministro da Informação dos Panteras Negras e fundador da sua sede internacional, se desentendeu com Huey Newton, em 1971, segundo kathleen Cleaver, sua ex-mulher, devido às interferências das forças de inteligência dos EUA, que infiltrou na organização para fomentar inimizades e, assim, destrui-la.

Por Abeba Makeda

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O Drama de Sudão


Há quem ache o movimento das nuvens apenas um processo normal (natural) da ordem universal, sem perceber os seus maravilhosos fluxos e significados. Quem ache, com base no tamanho do próprio cerébro, que é superior, melhor que o outro, suficientemente para subjugá-lo, desculturá-lo depois aculturá-lo, e tentar exterminá-lo. Há quem ache que não houve genocídio em Sudão, que tudo não passa de mero sensacionalismo jornalístico.

Genocídio, depois de 1944, vem sendo definido como a destruição deliberada e metódica de pessoas determinada por diferenças raciais, religiosas, políticas. O professor Molefi Kete Asante defende que “não pode haver desculpa para a escravidão e o genocídio”, sendo ambos “moralmente indefensáveis, brutalmente monstruosos e eticamente repugnantes” (in “Genocide in Sudan”). Em 1991, quando escreveu este artigo, Asante considerou que em Sudão o nacionalismo reivindica uma base biológica para a perseguição, opressão, exploração e escravização de outros, sucedendo a escravização de africanos pelos próprios africanos.

Em sudão unifica-se o famoso Rio Nilo, até o Egipto, vivendo a maioria da população, sobretudo os Shilluk nas suas margens, praticando o cultivo da terra e a agricultura, já que o resto do país é demasiado seca.

Os primeiros povos (Dinka, Jhaynah e outros dentre 500), que habitaram esta parte do continente africano/Alkebulan, eram principalmente constituídos de pastores nómadas que andam com os rebanhos em busca de novos pastos (o que igualmente revela o nível elevado de consciência), mas a “guerra santa” destruiu também as pastagens e rotas de pastoreio.

Desde a antiguidade o Sudão (palavra árabe usada primeiramente pelos geógrafos muçulmanos ao descreverem “a terra dos negros”) foi uma terra de confluência racial, sobretudo depois da queda de Núbia e da chegada dos árabes. Foi a primeira região que os árabes entraram em contacto e onde é grande a influência islâmica. A área divide-se em 3 partes: o Sudão ocidental (interior do Senegal e os rios do Alto Níger); o Sudão central (a leste do último); e o Sudão egípcio (do sul do Egipto). O Sudão egípcio foi conquistado pelo Egipto no século XIX, antes de ser novamente separada e reconquistada como “Sudão anglo-egípcio”. Hoje é o maior estado africano, a república do Sudão.

A fronteira actual entre o Egipto e o Sudão não existia. O Egipto do Sul e a parte norte do Sudão eram conhecidos em conjunto como a Núbia. Subsiste, no entanto, um grande contraste entre o norte e o resto do país. O norte é maioritariamente muçulmano, de língua árabe, o Centro e o Sul expressa línguas e crenças africanas. Os africanos residentes no norte foram convertidos ao islamismo e relacionam-se com o Egipto e o mundo árabe e o restante é na maior parte animista e liga-se ao mundo africano (diferem em relação à língua, formação, cultura e religião). Conflitos entre os dois grupos, assim como sucedeu em Ruanda, resultaram mais de duas décadas de guerra civil.

Desde a independência do país, em 1956, o governo sudanês impõe o islamismo à população. O prof. Molefi diz que “inerente à configuração política da nação foram as sementes da sua própria destruição: o fundamentalismo religioso islâmico e animosidade étnica” fecundadas “por uma da mais severa crise de identidade em toda a África” resultando mortes incomensuráveis, órfãos, refugiados, pobreza. A população residente no Sul do país, de culto e expressão africanos, foram forçados a dirigir-se para Kartum, a capital de Sudão, vivendo agora em bairros de lata nos seus arredores. O prof. Molefi também estima que “o Sudão é um país em crise permanente, pois é uma nação de pessoas totalmente deslocadas de um senso de realismo histórico”.

Assim, o século XIX no Sudão foi de jihads, guerras santas destinadas à propagação do islã e à criação de estados islâmicos. A partir do século XI predomina a vontade de impor o islã por todos os meios e a todos os níveis da vida social. O islã manteve, até o século XI relações de coexistência com as religiões locais africanas largamente dominantes no duplo plano de número dos adeptos e dos efeitos sociais e políticos. Igualmente, no século XI, as relações do islã com as religiões antigas, sobretudo as práticas e costumes locais mudaram quando a aceitação do compromisso e da coexistência cedeu lugar à vontade de impor o islã.

Houve por todo o lado uma vontade de uniformização dos modos de vida, de maneira a torná-los estritamente conformes com os preceitos, a lei e o direito do islã: adopção quase generalizada de nomes muçulmanos, transformação das regras de filiação e de herança, com a desaparição progressiva das regras matrilineares em proveito dos mecanismos da patrilinearidade; homogeneização dos gostos e dos hábitos alimentares na sequência da condenação de certas práticas e da promoção de outros comportamentos, importados ou adaptados de Magreb; mimetismo vestimentar; codificação estrita da condição e dos géneros de vida das mulheres, necessidade para as elites, no caso de quererem ser levadas a sério pelos seus interlocutores árabes, de mostrar que estavam perfeitamente informadas a respeito das teorias e dos debates do momento. O direito muçulmano era solicitado não só para justificar a exclusão dos ditos infiéis da posse da terra, mas também para regularizar os antagonismos crescentes entre os próprios muçulmanos.

Africanos islamizados, roubados da sua tradição africana, afligiram o povo africano, afugentando-o do próprio terreno e comunidade/família, legando-o campos de refugiados, sem nenhuma condição de sobrevivência. Hoje, Inúmeras crianças formam os órfãos do drama em Darfur, as mulheres vítimas de agressões sexuais e os homens estão quase todos mortos ou mutilados.

Entretanto, seguidamente à fragmentação do continente africano, às invasões (motivadas, sobretudo pelo ouro sudanês (petróleo), às longas lutas e conquistas libertadores, ainda, resta aos Alkebulanos o papel de resgatar a tradição africana ancestral, sua identidade, e salvaguardar, para a posteridade, a sua sagrada cultura. O professor Asante, no artigo “The Future of African Gods. The Clash of Civilizations” pede-nos para observar o seguinte: “Show me the gods we africans workship and i will show the extent of our moral and ethical decay”. Concluindo que os africanos esqueceram a sua tradição/memória e aceitaram os deuses daqueles que os escravizaram e colonizaram, por isso actualmente se encontra num estado de Maafa.



Veja o filme “Areias e Lágrimas”.

Abenaa.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

FRELIMO
JUNHO DE 1975/INDEPENDÊNCIA DE MOÇAMBIQUE
Ontem mesmo, me disseram categoricamente: "esse negócio de unidade africana foi uma fantasia política criada pelo Ocidente, nunca fez sentido para o africano esse negócio de unidade, panafricanismo e repatriação ... tudo besteira".
Disseram-me também, ontem, que os discursos dos movimentos de independência africano sempre estiveram distantes e apáticos a perspectivas políticas que integrassem a diáspora africana a África.

Maputo – Frelimo 1975

Será? Indaguei.
E foi esse “será?” que permitiu-me não ser enganado, resolvi expor a Frelimo (Frente de Libertação Moçambicana), de ontem, essa questão que envolve diáspora, ocidente, repatriação hoje.

A seguir, a resposta da Frelimo.

Irmão do Ocidente


Irmão do Ocidente...
(Como explicar-te que é nosso irmão?)
O mundo não acaba à porta de tua casa
Nem no rio que limite teu país
Nem no mar
Em cuja vastidão às vezes pensas teres descoberto
O sentido do infinito
Para além de tua porta para além
do mar
o grande combate continua
homens de olhar quente e mãos
duras como a terra
à noite abraçam seus filhos
E partem ao nascer do sol
Muitos não voltaram. Que importa!
Somos homens cansados das algemas
Para nós a liberdade
Vale mais do que a vida
de ti, irmão, nós esperamos, não a mão caridosa
que humilha e mistifica
mas a mão solidária
cometida, consciente.
Como podes recusar,
Irmão do Ocidente?

Frelimo – 1973
Por Kwesi.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

É neste momento
Que devemo-nos preparar
Pra enfrentar dificuldades

É neste momento
Que devemos decidir
Unir, Lutar, Avançar

É neste momento
Que devemos sentir com mágoa
O sangue derramado pelos nossos heróis.

É neste momento
Que devemos estar conscientes
Mais corajosos
Pra lutar nunca vacilar

É neste momento
Que devemos ter em mente
E compreender a causa de nossa luta.

É nesse momento que devemos voluntariamente
Entregarmo-nos a revolução.

Josina Machel

terça-feira, 25 de maio de 2010

Liberação Africana

Hoje, 25 de Maio de 2010, designado pela então Organização da Unidade Africana, actualmente União Africana, em 1963, o dia da liberação africana, foi ressaltado as atribuições de cada país africano que deveriam ser realizadas rapidamente de forma a pôr fim ao colonialismo e racismo. Líderes de países africanos conscientes do domínio económico, político e social, exercido sobretudo pelos europeus, em conformidade de sentimentos, opiniões e objectivos a alcançar, almejaram conjuntamente a liberdade do continente africano.

Unidade que ainda hoje é concebida e reclamada por todos os africanos (no continente ou na diáspora). Evidentemente que refiro particularmente àqueles africanos conscientes da sua identidade africana e, consequentemente, continuamente construtores da sua personalidade africana; cientes da condição da África antes da chegada dos assírios, persas, gregos, romanos, arábes e europeus, e da conjuntura actual de permanente planejada deterioração mental dos africanos (Maafa); convictos da necessidade de continuação da luta pela libertação cultural/mental, económica e política do nosso continente e da importância da Unidade como única via eficaz para alcançar este objectivo.

Todo africano/a que queira participar positivamente nesta luta, é fundamental interiorizar, ao mesmo tempo exteriorizar, a Un-Idade. Sem ela nem precisamos iniciar a luta, se é que podemos falar deste tipo de luta sem a Unidade. Primeiro, há que se organizar a unidade individual (mente, corpo e espírito), depois a unidade colectiva. Cada um deve estar em conformidade consigo mesmo e com todo o Universo para viver, de forma harmoniosa e equilibrada, no mundo actual. O africano, especificamente, necessita da Unidade (individual e colectiva), além disso, para resgatar a sua liberdade e dignidade. Segundo Sua Majestade Imperador Haile Selassie I, infra referenciado « Nossa liberdade é desprovida de significação a não ser que todos africanos sejam livres ». Para isso, nós os africanos carecemos de Un-Idade.

Irmã Tasha já tinha dito no seu artigo publicado numa revista “Rasta-centrada”: “Individuality is a Given, But Unity is a Must”. Uma luta individual só terá significação se for feita de forma favorável à uma realização colectiva.

Todos os anos publicamos mais um artigo sobre 25 de Maio, não com o intento de integrar o ambiente sistemático que é criado neste dia (sabemos bem por quem), porém, aproveitando o momento, para frisar resumidamente valores e princípios humanos básicos à efectiva evolução humana, recorrer ao passado para melhor guiar o futuro e reflectir o significado e real alcance da liberação africana.

Quarenta e sete (47) anos se passaram, a luta pela Un-Idade continua.


UMOJA.

Por Abeba
*

Sua Magestade Imperial, Imperador Haile Selassie I, fala sobre Unidade Africana.
«A Organização da Unidade Africana é uma organização que o povo do nosso vasto continente estabeleceu a fim de performar certas tarefas específicas.
Resumidamente, a organização é instituída com o propósito de proteger, de melhor forma, a independência dos estados africanos. Também significou para acelerar o progresso económico e social através da cooperação de povos africanos. Também teve uma importante tarefa de assistir na manutenção da paz e segurança internacional. Nós sabemos que unidade pode ser, e tem sido alcançado entre homens das mais diferentes origens. Essa diferença de raça, de religião, de cultura, de tradição, não é um obstáculo intransponível para a vinda juntos de povos.
Nós erguemos hoje no palco dos assuntos mundiais, antes da audiência da opinião mundial. Nós viemos juntos para reclamar nosso papel na direcção dos assuntos mundiais e para lançar nosso compromisso com o grande continente do qual 250 milhões de pessoas nós lideramos. África está hoje no meio da carreira – em transicção da África de ontem para a África de Amanhã. Precisamente como estamos neste lugar, movemos do passado para o futuro. A tarefa pelo qual nós temos embarcado, a construção de África, não irá esperar. Nós precisamos agir para definir e moldar o futuro e deixar nossa impressão em acontecimentos quando eles passam para a história. Nós pretendemos neste encontro determinar para onde estamos indo e traçar o curso do nosso destino. Isto não é menos importante que nós conheçamos donde viemos. A consciência do nosso passado é essencial para o estabelecimento de nossa personalidade e nossa identidade enquanto africanos.
Há aqueles quem protestam que Unidade Africana é impossível, que a força que nos puxa, alguns nessa direcção, outros naquela, é muito forte para ser vencida. Ao nosso redor não há carência de dúvidas e pessimismo, nem falta de criticos e crítica. Estes discursos de África, do futuro de África e sua posição no século 20, em pedra sepulcral. Eles dirigem discórdia e desintegração entre africanos e brigas mortíferas e caos sobre o nosso continente. Deixem-nos confundi-los e por nossas acções, dispersá-los em confusão. Há outros cujas esperanças para África são resplandescentes, que mantém com a cara erguida em maravilha e temor na criação de uma nova e feliz vida, que têm dedicado a si mesmos para esta realização e são estimulados pelo exemplo de seus irmãos a quem eles devem as realizações do passado africano. Deixem-nos recompensar sua confiança e mérito confirmação deles ...
Nossa liberdade é desprovida de significação a não ser que todos africanos sejam livres.»

Extracto de discurso publicado em: “My life and Ethiopia´s Progress”, Vol. 2, por Haile Selassie I (Research Associates School Times Publications/Frontline Distribution International, 1997).


Traduzido por Abeba

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Lumumba, mártir e herói (República Democrática do Congo - RDC)

Quase no centro do continente Africano encontra-se um imenso território de 2.350.000 km ². Talvez seja o território mais rico da África. Neste desconhecido território abunda o diamante, ouro, petróleo, pedras de várias espécies, e um elemento muito cobiçado que faz funcionar o telemóvel que tens em suas mãos, o coltan. Esse país foi chamado Congo, depois Zaire, hoje República Democrática do Congo (RDC).

Mas a RDC, apesar de sua riqueza, foi empobrecida. As transnacionais levam minerais e hidrocarbonetos, às vezes sem pagar um tostão, muito pelo contrário, deixam um rastro de conflitos entre “etnia” (grifo nosso), sangue, morte. Dos mais de 60 milhões de habitantes desse país, menos de 5 milhões têm uma vida decente.

Este país sempre foi saqueado. As terras do Congo foram destruídas pelo rei belga Leopold II, que fez desta nação sua propriedade privada. Esse rei levou o marfim e a borracha, à custa de matar elefantes com mão-de-obra escravizada. Dizimou a população, matando, mutilando, escravizando e quando se cansou a cedeu para a colonialista Bélgica que não faria nada para mudar a situação. Tanto aquele cruel monarca como o seu império, contaram desde 1884 com o apoio dos governos dos Estados Unidos, os impérios europeus, e a Igreja Católica. Após iniciar os anos 1960, os imperialistas belga, empregaram métodos brutais para explorar a população congolesa. O flagelo (ou chicote) era utilizado às vezes até matar aqueles que não cumpriam com o seu trabalho escravo, incluindo bebés. Foram milhões os mortos pela exploração imperial.


Lumumba, morrer para viver
Nesse Congo oprimido e rasgado cresceu Patrice Lumumba. Era um dos 100 ou menos nacionais que conseguiram alcançar a educação universitária no seu país antes de 1950. Ele organizou o Movimento Nacional Congolês, e exigiu pacificamente a independência aos imperialistas Belgas. Estes depois de medirem os seus passos, acederam por causa do grande apoio popular do jovem Lumumba. Fizeram tudo para sabotar a nova nação independente.Levaram até os telefones de escritório, infiltraram o exército, limparam as contas bancárias. Eles não queriam aquele negro que desafiou o rei Beduino com estas palavras:
"Durante os anos 80 de domínio colonial sofremos tanto que não podemos afastar as feridas da memória. Fomos forçados a trabalhar como escravo por salários que nem sequer nos permitam comer o suficiente para afugentar a fome, ou vestir-mos, ou encontrar alojamento, ou criar os nossos filhos como seres queridos que são. Sofremos ironias, insultos e agressões dia após dia só porque somos negros... As leis de um sistema judicial que somente reconhece a lei do mais forte nos arrebatam as terras. Não há igualdade; as leis são suaves com os brancos, porém cruéis com os negros. Os condenados por convicções políticas ou religiosas sofreram horrivelmente; exilados no seu próprio país, a vida tem sido pior que a morte. Nas cidades, os brancos têm casas magníficas e os negros espalhados em barracos; aos negros não permitiram-nos entrar no teatro, restaurantes ou as lojas para europeus; tínhamos que viajar em porões ou aos pés dos brancos sentados em cabinas de luxo. Quem pode esquecer os massacres de muitos dos nossos irmãos, ou as celas que foram metidos aqueles que não se submetem à opressão e exploração? Irmãos, assim tem sido a nossa vida ".

"Mas nós, os que vão dirigindo nosso querido país como representantes eleitos, que sofreram no corpo e na alma a opressão colonial, declaramos em voz alta que tudo isso está acabado agora. Foi proclamada a República do Congo e o nosso país está em mãos de seus próprios filhos ".

Este homem negro era perigoso. Anunciava que os congoleses administrariam suas próprias riquezas, anunciava que as multinacionais estavam indo embora. Era um louco! Um revolucionário! Isso não o permitiria os imperialistas do mundo. Isso não estava nos planos da CIA, era uma catástrofe para o "mundo livre." Os imperialistas E.U. e belgas decretaram a sua morte imediata. Em 6 de Outubro de 1960, o governo belga ordenou "eliminar definitivamente Lumumba.

E veio a perseguição e a traição. A cumplicidade das tropas da ONU que permitiram a sua tortura sem intervir. Assim, foi capturado em 2 de Dezembro de 1960, submetido a torturas e exibido como um criminoso perante jornalistas e diplomatas inertes. Mas ele jamais perdeu a sua dignidade.

Em 18 de janeiro de 1961, o primeiro-ministro Patrice Lumumba, de apenas 35 anos, foi baleado por um esquadrão de assassinos. Seu corpo foi dissolvido em ácido de mineração. Um capitão belga dirigiu a operação na presença de agentes da CIA e traidores da pátria.
Carta à sua mulher, Pauline Lumumba, janeiro 1961, uma semana antes de seu assassinato
"Nenhuma brutalidade, maus-tratos ou tortura me demove, porque preferiria morrer com a cabeça erguida, com uma fé inquebrável e uma profunda confiança no futuro do meu país, a viver submetido e pisoando princípios sagrados. Um dia a história nos julgará, mas não será a história conforme Bruxelas, Paris, Washington ou as NU senão a dos países emancipados do colonialismo e seus fantoches ".

Hoje, os congoleses continuam a luta contra as transnacionais de petróleo e mineração, patrocinados pelos impérios. Mais do que nunca fazem eco as palavras pronunciadas por Lumumba no dia da independência. Por ele não devemos acreditar numa palavra dos imperialistas.
Reinaldo Bolívar
www.rebelion.org/noticia.php?id=52727
Em Casas de Africa.

terça-feira, 16 de março de 2010

“Mulher Sagrada: O estado do seu ventre reflete o estado da sua vida*”

O ventre é o portão de toda a vida humana. Quando o ventre é honrado e respeitado, ele se torna um canal de poder, criatividade e beleza – e a sua alegria reina sobre a terra. Quando a sua voz não é ouvida, não é respondida, é negada, o ventre torna-se um vaso de doença.

O estado coletivo dos ventres das mulheres reflete a condição do mundo. Quando, de fato, muitos úteros de mulheres sofrem de tumores, cistos, frigidez, e sangramento mestrual excessivo, quando, de fato, muitas mulheres experimentam atos agressivos sexualmente e histerectomias (extração total do útero) desnecessárias, então a desarmonia cobre a terra.


A condição dos ventres das mulheres também reflete diretamente as condições das mentes, dos espíritos, e ações das mulheres. O ventre é o depósito das nossas emoções. Ele coleta todos os sentimentos – bons e maus. Hoje nós temos alcançado coletivamente um estado de “poder negativo do ventre”.


A vida não natural e o estilo de vida não sadio perpetua o poder negativo do ventre, e isto transforma-se em suporte de conflitos de homens contra o planeta, homens contra homens, e mulheres contra o ventre. A condição do ventre das mulheres reflete a condição de todos as seus relacionamentos. Quando o ventre da mulher está num estado saudável, sua vida é uma reflexão deste balanço.


O amor e o cuidado que a mulher dá ao seu ventre reflete o seu verdadeiro nível emocional, espiritual, físico e saúde mental. Infortunadamente, muitas mulheres no mundo de hoje também experimentam alguma forma de degeneração do ventre que resulta em doença. Como nós mulheres curamos e transformamos nossos ventres, nós mudamos nosso destino e o destino do nosso planeta.


Mulheres, está na hora de pegarmos de volta o controle. Nós devemos defender nossos ventres com nossas vidas, porque o ventre é a terra natal de todas as nossas habilidades criativas.


*Pequeno trecho traduzido de “The state of your womb reflects the state of your life” p. 2. In Sacred Woman: A guide to healing the feminine body, mind, and spirit, de Queen Afua, a partir de leituras feitas entre Núbia Maré e Vadinho, e Núbia Maré e Indira.

kontribuison khemsvibe.

segunda-feira, 8 de março de 2010

MULHER

Nossa mãe-rainha.

Outrora grandes Candaces (mães-rainhas), criadoras, governantes, conselheiras, protectoras, divindades, guerreiras, companheiras. Desde o princípio a mulher sempre esteve Pre-sente. Contribuiu, juntamente com o homem, no percurso normal do Un-I-Verso, de forma recíproca. É a fundadora e a primeira educadora da humanidade. Recebe a Vida, lhe alimenta, cria e apresenta ao mundo, à sociedade.

No início eram a mulher e o homen, “Carne da minha Carne e Ossos dos meus Ossos” - Umoja. Por isso, adulto “o homem deixa o seu pai e a sua mãe para se unir com a sua mulher, e os dois se tornam UMA só pessoa” (in bíblia sagrada).
«A mulher é o repositório da civilização, a guardiã dos segredos da sociedade, mãe de deuses, a manifestação de um princípio universal “feminino” que viu o universo, a terra e o subconsciente como o “útero” para a expressão da vontade Divina».[1]

Podemos citar a Candace Tyie, “a moda é profundamente influenciada por ela. Seu estilo de cabelo, seus brincos, ... dita a beleza feminina na corte real.”[2]

Governou como cônjuge rainha e mãe rainha de Egipto por metade de um século, antes de Cleopatra e Nefertiti. Foi a Candace nubia (terra de ouro) de egipto, Grande Esposa Real de Amen-hotep III, que disse ser ela «a rainha, a mais estimada, a esposa de graça, delicada em seu amor, quem preencheu o palácio com a sua beleza, a Regente de Norte e Sul, a Grande Mulher Rainha do Rei que a ama, a senhora de ambas as terras».

Mãe, por imposição legal, de Candace Nefertiti, que era casada com Akhen-aton, o mais velho dos seus sete filhos. Quando tinha quase 50 anos trouxe ao mundo o seu último filho, Tut-ankh-amen.

Nefertiri, foi uma outra grande Candace: a Rainha duma Missão Sagrada. No seu Tempo a mulher não era principal, que profetizava ou participava nas políticas sociais, mas objecto de sensualidade ou para ser usada pelos homens. Regista o Código de Hamurabi (fonte das actuais legislações) a época que havia o Tirhato, o preço da mulher para transações afectivas. O esposo comprava a sua mulher e podia fazer dela o que quisesse. Tornar a mulher um valor de troca, fazê-la assim sentir, foi empiricamente determinado por psicólogos antigos que pretendiam eliminar o ar de superioridade do nariz da mulher.

Entretanto, Amun-hotep IV (posteriormente, Akhenaton) escolheu a Nefertiri para ser a sua grande rainha mulher, a fundação da sua família. Ela que foi a mulher mais estimada daquele tempo. Principalmente porque não tencionava perpetuar a antiga ordem. Não quis relegar-se a norma tradicional de rainha servil.

Ela visionava um papel activo para ela na remodelação da civilização. Então, numa época de intensos conflitos no Egipto contra o domínio do clero sobre a sociedade, Nefertiri e Ankhenaton decidiram construir uma nova cidade, Akhetaten. “Uma cidade onde a arte pode florescer, onde homem/mulher querem representar a beleza, paz e felicidade”. Nesta cidade, puderam dar nascimento à sua sagrada missão: a missão à procura da Vida Divina, durante a qual tiveram seis filhas.

Como Isis, Nefertiri fez o que pode para manter o domínio de Ma´at (mulher rainha da Ordem, Equilíbrio, Equidade, Verdade, Justiça, rectidão).

E a Isis é a nossa «original madonna (Virgem) negra, a senhora dos milhares de títulos, a Grande Feiteceira, Senhora do Paraíso, sensibilidade feminina, Amor de Irmã, Senhora da Magia, Senhora da Luz, Aposento-de-Nascimento-de-um-Deus, Senhora do Nascer do Sol, A Bela e a Amada, Senhora da Abundância, Rainha Abelha: Fazedora de Mel, Aquela que Chora...» e abunda o Vale de Nilo.

Em períodos mais recentes já sobressaem as grandes rainhas guerreiras africanas como a Grande Rainha Hatshepsut, uma das primeiras rainha-guerreira da história africana, que proclamou-se Pharaoh de Egypto e bem a governou por, dissem, 21 anos.

Também quando a Ethiopia era o centro do mundo, antes da Europa emergir, era governada por uma rainha, Candace Makeda, a Rainha de Sheba. Dissem-nos que a sua luta foi mais diplomacia do que militar, ao contrário do que foi para a Hatshepsut.

Em Angola, outrora Ngoli Nbondi, havia a poderosa Nzinga que fortemente lutou contra o colonialismo português. Quando os portugueses desembarcaram, ela tentou negociar (conversar) com eles, mas quando percebeu que eles pretendiam apenas roubá-los, assimilá-los, desculturá-los e aculturá-los, em detrimento da sua própria cultura africana, organizou o exército e liderou-lhe numa luta armada contra tal colonialismo.

Grande defensora da independência e Liberdade do seu país, ela dizia “mais valia a morte de arco e lança na mão, sim senhor, que a vida, mesmo de mil anos, servindo. A vida de escravo.” (Leia mais neste blog sobre: Nzinga Mbandi Ngola. Meio caminho não andaram: uma carta).

Na resistência ao comércio de escravos e o sistema colonial, mulheres africanas, ao lado dos seus companheiros ou maridos, ajudaram a montar ofensivas por todo o continente africano: Empress Menem e Titul Bitul de Ethiopia, Tinubu de Nigéria; Nadi, a mãe do grande guerreiro Chaka; Kaipkire do povo Herrero de sudoeste de África; e o exército feminino que seguiu o grande rei daomeano, Behanzin Bowele.

A Yaa Asantewa, mãe rainha de Ejisu, que foi expatriada por ter inspirado a guerra do povo Ashanti – a denominada Guerra Yaa Asantewa – contra os britânicos que mantinham exilado o seu rei Prempeh para conseguirem o Banco Dourado, a arca de aliança deste povo.

A Harriet Tubman, grande condutora de Underground Railroad, que levou à liberdade vários escravos nos Estados Unidos da América, e outras grandes mulheres africanas da actualidade (dentro e fora do continente), fundadoras e educadoras das suas famílias, companheiras, grandes líderes e governantes, que permanecem perseverantes na luta pela liberdade, igualdade, justiça.

A mulher tinha (e ainda tem) um valor (não de troca para transações afectivas) e sabia disso, conhecia o Segredo da Vida e respeitava-a, não havia necessidade de preocupar-se com a afirmação. No entanto, a mulher de hoje co-habita mais o homem num círculo activo de agressões (verbal, física e espiritual). Sendo poucas aquelas que queixam-se ou libertam-se deste ambiente ambivalente e inúmeras as que suportam a dor conforme podem (Leia “Foram as dores que o mataram”, em Mornas as Noites de Dina Salústio,).

É unânime que a Educação (principalmente a educação-alternativa) é o principal remédio para a resolução efectiva desta problemática denominada “violência baseada no Género” ou, concretamente, “Violência Doméstica”. Uma situação, condição ou factor crescente de corrompimento da raiz da família, que reduz caoticamente a actuação positiva da mulher na sociedade como fundadora e educadora da família, ao invés, constitue famílias desiquilibradas e desestruturadas, uma plêiade de jovens com mentes transtornados, assim, de efeito espiral.

Presentemente, a luta permanente da mulher africana tem sido resgatar o seu valor e dignidade ancestral e não apenas a Igualdade e Equidade de Género. Ela pretende alcançar um estado de igualdade com o homem, mas, permitam-nos dizê-lo, claro sem generalizar, tem o feito de forma equivocada, sem antes procurar o ontem, no passado. Sem antes identificar ou conhecer o que fora. Aí, ela vem mudando e ensinando comportamentos, faz trabalhos pesados como carregar penedos, é novamente chefe, porém prossegue desconhecendo o seu Real Valor.

Analiticamente, em relação à mulher Rainha e guerreira de Nubia, Egypto, Ethiopia, Angola, Gana, Nigéria, Daomé, nota-se que hoje ela reflecte, mesmo inconscientemente, os hábitos e aspirações da mulher européia, principalmente da antiga Grécia e Roma, em constante repressão à acção da sua verdadeira identidade.

Interessa à mulher africana actual, rainha e guerreira, ser e estar em equilíbrio e harmonia com a Vida em total respeito à Ordem das coisas. Ela precisa regressar ao seu útero (nascer de novo) e destruir este sistema anacrónico que lhe atribue apenas um valor pecuniário, a condição de simples propriedade privada (“pikena”).

Neste mês de Março, considerado da Mulher e principalmente a Mulher Africana, honramos todas as nossas grandes mulheres mães, rainhas e guerreiras.

Ababa Abenaa.

[1 e 2] Tradução

... A MULHER IDEAL ...

Amando como um louco, em busca da ventura,
procuro em vão no mundo uma mulher ideal!
Por cada amor que tive, uma mulher fatal
surgiu na minha estrada, e trouxe-me amargura!

Por cada amor que tive – um sonho meu desfeito,
um sonho encantador, que abraço com paixão!
Sonhar que se desfaz em cálida ilusão,
que abruma, sangra, fere e abandona meu peito!

Por cada vez que amei, imaginei um anjo,
uma mulher divina, altiva e caprichosa!
A flor do meu jardim, a perfumada Rosa,
um ente celestial mais puro que um arcanjo!

Por cada vez que amei, minha rosa sonhadora
sonhou prazer, ventura e um mundo delicioso ...
Viu tudo côr de rosa, ameno e fulgoroso,
E, ao fim, quedou-se triste, aflita e sofredora!

Por cada amor que tive, a minha lira pobre,
entusiasmada e alegre, o meu amor cantou.
A flor por mim amada, ao píncaro elevou
da pura adoração, da santidade nobre!

Desiludida, ao fim, em voz triste e pungente,
a lira que cantara, a minha dor chorou!
Em verso doloroso, amargo, ele cantou
meu mal, minha ilusão, a sina dum sofrente!

Por cada amor que tive, eu tive uma ilusão,
um sonho de inocente, um dia de amargura!
Ferido pela dor, em vez de ter ventura,
recolhe-se a chorar meu pobre coração!

Meu peito desdenhado em busca dum amparo,
volúvel se tornou, amando dia a dia!
Procuro, em vão no mundo, o amor, uma alegria,
duma mulher celeste, um ente puro e raro!

Amando como um louco, em busca da ventura,
procuro em vão no mundo uma mulher ideal!
Porém, por cada amor, uma mulher fatal
encontro em minha via, e deixa-me amargura!


Abel Djassi (Amílcar Cabral)

Ninam na bus brasus

Mama Afrika, ventri sagradu di undi brota vida,
Fonti di inspirason pa kaminhus di retidon, amor e verdadi, mãe di amor inkondisional,
Di tudu sufrimentu, di tudu injustiza ki bus fidjus dja pasa, inda bu ka disisti di um dia tenéz na bus brasus,
mostranu kaminhu di volta pa kasa, inda nu sta perdidu, nu sta spadjadu pa tudu kantu des mundu, emigrantis klandestinus na diáspora.
Bus fidjus inda ka disisti di torna dau bu lugar, bu verdaderu lugar, bu tronu di rainha, raínha di raís finkadu.
Mama ventri di mudjeres di dor, mas lutadoras... di forza, kontinenti di mudjeris negras di pele brilhanti sima noti di strela.
Mudjeres di beleza inigualável e kubiçadu pa kenha ki ka ta podi intendi nós origem.
Nu volta pa nós kasa, pa nós verdaderu ragás, undi nu ka ta djobedu ku ódio, nem dispresu...afinal nós é di mesmu raíz.
Nu dexa mama Afrika toma konta di nós, nu dexal kontanu e kantanu nós stória, nós verdaderu stória sem mas, sem menus, mas nós stória. Txom di homis di koragem, homis di resistentis... nu bem xinta na sterra e prendi ama di novu, nu bem prendi adimira nós negros e negras, nu bem konxi nós ancestrais...nós heróis e nós iternus guerreiros.
-Hora kin tchiga na bó mama, dexam deta nha kabesa na bu ragás, dexam txora tudu nhas doris, nhas máguas...
Passa bu mon na nha kabesa di mansinhu, ninan na bus braços, dam amor sarra nhas fridas...
Danu dom di perdon..djunta bus fidjos ki exploradoris spadja...
inxinau ama.. ama... y ama...

(escrito em 19/12/09, às 18:26 por Ama)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A revolta de Ribeirão Manuel

A 12 de Fevereiro de 1910, Nha Ana Veiga lidera em Santa Catarina, na ilha de Santiago – Cabo Verde, a revolta de rendeiros de Ribeirão Manuel, que se recusaram a pagar as rendas aos “morgados” e passaram a colher, sem licença, sementes de purgueira nas suas propriedades.

A revolta de Rubon Manel, muito marcante entre outras revoltas, ocorreu um mês após a Proclamação da Re-pública em Portugal e a posse, na Cidade da Praia, do Governador Marinha de Campos. Ribeirão Manuel sobressai um contexto que a forma de exploração agrária agrava as estruturas de arrendamento em anos de intensa seca e de má colheita, reanimando as tensões entre os morgados e rendeiros.

Os proprietários rurais, estrangeiros feitos Morgados por cartas régias, com falta de escravos, que fugiam continuamente para o interior das ilhas de Cabo Verde, fixando-se em locais de difícil acesso, e de trabalhadores livres, foram forçados a parcelar as suas fazendas em pequenos tractos, dando-os de arrendamento, a dinheiro ou em regime de parceria, aos escravos alforriados, aos auto-libertados e aos libertos por imposição legal ou nascidos livres.

Estes rendeiros, que foram obrigados a servir de rendeiros e de parceiros, aliados às camadas mais desprotegidas, quando tomaram consciência da sua força e importância social, projectaram e executaram diversas rebeliões contra os grandes proprietários de terras, forçando-os a rever em parte as estipulações do contrato de arrendamento.

A ilha de Santiago, marcada pelo sistema de exploração de morgadios, regista a referida revolta que surge das apanhas de purgueira, planta muito rica utilizada na produção de óleo, sabão e que funcionava como moeda de troca no Ribeirão Manuel. Os terrenos de Riberão Manuel faziam parte do monopólio exclusivo dos morgados, pelo que as tropas da cavalaria, após queixa do morgado Aníbal dos Reis Borges contra algumas mulheres, alegando que estas teriam invadido a propriedade da irmã para roubar a purgueira, surpreendendo estas mulheres, as amarraram mesmo sob o protesto do povo.

Segundo relatos, o Padre António Duarte da Graça insurgiu-se contra a prisão deste pequeno grupo de mulheres que tinham colhido ilegalmente sementes de purgueira selvagem.

E o protesto do padre transformou-se numa revolta da população que, comandados por uma mulher, a Senhora Ana Veiga, organizou-se e decidiu libertar as suas mulheres, os homens de pedras e as mulheres de machados marcharam, sob o lema "Aqui não há negro, não há branco, não há rico, não há pobre... somos todos iguais!", em direcção à cadeia de Cruz Grande que acabou por ser aberta perante a sua determinação.

Assim, resulta o provérbio "Omi faka, mudjer matxadu, mininus tudu ta djunta pedra" (Homem faca, mulher machado, meninos ajuntam pedras).

Abeba

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Reciclando utensílios reutilizando ideias

A Associação Comunitária Waaldé tem na sua linha de actuação os que mais necessitam. Um dos seus objectivos é promover melhores condições às mulheres e crianças.

Pensando nesta camada, desenvolveu um projecto orgulhoso e de grande valor social: “Reciclando utensílios reutilizando ideias”. O projecto teve como base a produção de doces caseiros com produtos naturais e reciclados. O público-alvo da formação foram jovens, mulheres, mães, desempregadas ou de baixo rendimento, residente em Achadinha.

Com o financiamento vindo da própria associação e do Programa Nacional do Voluntariado sob a tutela do Ministério do Ministro-Adjunto e da Juventude e Desportos, o projecto foi adiante com muito entusiasmo e dedicação. Para além do grande propósito ser ajudar estas mulheres a criarem uma fonte de rendimento em comum, também desejou-se que elas criassem uma ligação de amizade e sobretudo de solidariedade e inter-ajuda.

Apesar da data de arranque do projecto ter sido afixado de Setembro a Outubro, a sua preparação começou muito antes com a divulgação no bairro, local onde foi realizado o tão aguardado projecto, e na rádio.

Todas as fases foram feitas com muito esforço e luta por parte dos elementos da associação que, entretanto, nunca desistiu desta grande luta em prol das suas companheiras.

Após todo o trabalho feito, finalmente, chegou o grande dia, que foi acompanhado de muita chuva, para abençoar ainda mais o momento. Os dias foram passando e cada etapa da formação foi mais uma ocasião para amadurecer e fortificar o laço de união criados entre todos os que, de alguma forma, participaram no projecto: quer sejam as formandas, os elementos da Waaldé, ou os formadores, que se disponibilizaram vivamente, para dar a sua contribuição.

No final, todos levaram um pouco de cada um. Com os erros e dificuldades, aprendemos para melhorar futuros projectos que certamente virão. Acreditamos que é possível criar alternativas de sobrevivência com poucos recursos e muita criatividade, respeitando sempre o meio ambiente.

Ama

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Ayiti, a outrora “pérola das Antilhas”


“TODO Homem é UM Homem”.

“Os despertos pertencem a UM mundo, mas os adormecidos têm cada um mundo”.

Conhecida pelo primeiro povo, dito ameríndio, a 7.000 A.C., pelo nome de Quisqueya significando na língua Taíno “Mãe da Terra” e Haiti traduzindo “país montanhoso” ou "terra alta", mais tarde pelos criollos por Ayiti, é depois de Cuba, a segunda maior ilha caraíbas, ocupando a terça parte ocidental da ilha que partilha com a república Dominicana.

Em 1492, no decurso duma viagem de exploração para o ocidente, Cristo-vão Colombo chega a Quisqueya chamando-a de Hispaníola e os espanhóis logo fixaram fortalezas no litoral, desprezando a anterior presença humana. Ou seja, logo depois, colonizam a ilha, segundo eles com o fim de “promover a civilização dos ameríndios”, ocorrendo entretanto a escravização dos ameríndios para trabalharem na agricultura e cerâmica.

Em menos de 15 anos, a Espanha extraiu em Ayiti 15.000 mil toneladas de ouro. Depois de quase exterminar os ameríndios, em 1697, assina o Tratado de Ryswick e concede a parte ocidental da ilha, onde fica Ayiti, à França. Hispaníola passa a ser chamada pelos franceses de Saint Domingue (S. Domingos).

Quanto a França, por durante 100 anos, a "pérola das antilhas" alimentara o essencial do seu comércio internacional. O açúcar, café, algodão, índigo, a madeira, entre outros, enriqueciam os negociantes estrangeiros enquanto os africanos viviam como animais de tracção.

Durante todo o século XVIII os franceses incrementaram a formação da agricultura açucareira na região, importando cerca de 500.000 escravos africanos.

No entanto, torna-se frequentes revoltas de escravos. Em 1757, um escravo originário da Guiné, chamado Makandal, “o velho homem das montanhas”, assume o comando de um grupo de auto-libertos, utiliza as crenças do vodu e incita os negros a matar brancos através de veneno. Em 1758, é capturado, condenado à fogueira como feiticeiro e queimado vivo. Mas os negros continuaram a venerar Makandal como profeta e, desde então, todos os ritos usados por eles passaram a ser chamados de makandals. O carácter político do vodu tornou-se tão evidente que tudo se fez para impedir qualquer manifestação religiosa dos negros. Em consequência, os franceses e principalmente a Igreja Católica passaram a reprimir ferozmente o vodu. Padres manifestaram o desejo explícito de extirpar as crenças africanas no país. Em 1941 decretou-se uma campanha para fulminar o vodu, considerado “macaquice, indigna de povo civilizado”. Em 1860, o Ayti e o Vaticano assinam uma Concordata que conduz a punição criminal do vodu.

Acontece uma outra revolta contra a autoridade colonial francesa, em 1790, liderada pelo Vicente Ogé, que acabou preso e torturado. Contudo, a revolta aumenta e os escravos fugem em massa, precedendo a enorme revolta de escravos de Agosto de 1791.

A revolução aytiana foi sempre constante. Os africanos se rebelaram no momento da sua captura na África, nos navios e nas plantações. Boukmann, líder da revolta de escravos de Agosto de 1791 no Ayiti, era um escravo de campo importado da Jamaica, que deu sua vida num esforço para livrar o mundo da escravidão.

Boukmann presidiu uma reunião política em Bwa Kayiman para planejar o fim da escravidão no Ayiti, um evento que teve repercussão mundial, inspirando rebeliões na Carolina do Sul, Louisianna, Virgínia e nas Américas, levando ao fim da escravidão em todo o mundo jurídico.

Após esta reunião, a revolução entrou em erupção no norte do Ayiti, e se espalhou pela ilha toda. Um terço da população do Ayiti, homens, mulheres e crianças lutaram e morreram para o benefício das gerações futuras, queimando plantações e matando os proprietários e capatazes.

Essa revolução durou até 1804. Financiados pelos ingleses e espanhóis, inimigos dos franceses, negros e mulatos se unem sob a liderança do intelectual africano Toussaient-Louverture, descendente dos reis da Arada, filho de Gaou Guinou, um poderoso guerreiro, que através de lutas em África foi escravizado e embarcado para o Caribe, nasceu a 1 de Novembro, no Caribe, e cresceu para ser um nobre, médico, ervalista e curandeiro.

O general Louverture comanda a revolta de Boukmanns, que conduz a uma guerra de libertação prolongada de 13 anos contra os colonialistas de S. Domingos (hoje capital da República Dominicana) e depois, o exército de Napoleão.

A França declara a abolição da escravatura nas colônias. Toussaient prepara a independência do Ayiti, cuida da volta dos antigos escravos à lavoura do país quase devastado e prepara um projecto de constituição. Entretanto, o novo governo francês, sob o comando do cônsul Napoleão Bonaparte, rejeita a proposta de Toussaient e, valendo-se da traição, envia Toussaient para a França, onde morre prisioneiro, recuperando assim a antiga colónia. Porém, um dos generais de Toussaient, o Jean-Jacques Dessalines, organiza o exército, continua a rebelião e expulsa as tropas francesas, derrotando a França, e proclamando a primeira república negra do mundo, em 1 de Janeiro de 1804.

Adquirida a independência (reconhecida pela França somente em 1838), foi preciso não apenas curar as feridas mas também pagar à França em troca uma indemnização financeira de 150 milhões de francos.

A maioria das nações incluindo os Estados Unidos evitaram Ayiti por quase quarenta anos, temível que seu exemplo poderia agitar lá e em outros países escravocratas. Sobre as seguintes poucas décadas Ayiti é forçada a remover empréstimos de 70 milhões de francos para reembolsar a indemnização e para ganhar reconhecimento internacional.

O inimigo tinha destruído tudo antes de isolar completamente o país, colocando-lhe numa situação impossível com medo do contágio, ante, como referido, o pensamento de que toda a caraíba podia ser influenciada pelo mau exemplo. O país isolado pelas grandes potências ocidentais, obrigado a pagar a Paris o preço em ouro da independência, reduz-se a um estado desestabilizado.

Em 1862, os Estados Unidos finalmente concedem a Ayiti o reconhecimento diplomático enviando o notável abolicionista Frederick Douglass como seu ministro Consular. Depois de 53 anos, em 1915, os fuzileiros navais de Estados Unidos da América ocuparam o Ayiti e estabeleceram o controlo sobre as autoridades alfândegárias e portuárias, assumindo o governo, sob o pretexto de proteger os interesses norte-americanos no país, no entanto a fim de cobrar a dívida externa, reprimir o vodu, entre outros.

De 1915 a 1934 o Ayiti conheceu a mais terrível humilhação da sua história: a colonização americana. A independência duramente conquistada e zelosamente preservada até então, é posta em causa com o desembarque dos “marines” americanos. Sem dúvida, antes de 1915, as potências imperialistas européias, aliadas à burguesia do país já disputavam entre si o mercado aytiano. Mas a ocupação americana, que se fez sob os moldes de colonização directa, acabará por orientar e integrar as estruturas do país dentro do capitalismo monopolista. O Banco Nacional, o comércio, a administração e o Exército serão totalmente colocados sob controlo do imperialismo americano. Camponeses serão expropriados e condenados a trabalhos forçados.

Diante do racismo da ocupação americana, adversários desta ocupação, como Charle-magne Peralte, leva os camponeses da região de Artibonite à insurreição. A resistência camponesa aos ocupantes cresce sob a liderança de Charle-magne, que é traído e assassinado por fuzileiros navais em 1919.

Em 1946, uma rebelião popular derruba o presidente mulato Elie Lescot, levando ao poder o negro Dumarsais Estimé. Desde a considerada crise de 1946, que não chegou a ser uma revolução no país, proprietários de terra e pequenos burgueses negros agitaram a bandeira do nacionalismo por uma participação no poder económico e político até então controlada pela burguesia mulata.

Depois eleições controladas militarmente conduzem à vitória do François Duvalier (1954), que em 1964 declara a si mesmo presidente vitalício e instaura uma ditadura violenta baseada no terror dos tontons macoutes (os "bichos papões"). Durante 35 anos esta ditadura assume uma realidade de exploração, injustiças e crimes.

Expulsos pela brutalidade da máquina repressiva ou pelas estruturas de exploração, muitos ayitianos, os boat-people, fugiram em pequenos barcos para a Flórida/Estados Unidos da América, onde posteriormente foram presos e despachados para o território ayitiano, sem tecto, família nem emprego.

O Ayiti de 1986 a 1990 foi governado por uma série de governos provisórios. Em 16 de dezembro de 1990, Jean-Bertrand Aristide foi eleito e assume a presidência de Ayti, a 07 de Fevereiro, num contexto que segundo o próprio “o país era um depósito de lixo”, as ruas esburracadas, as favelas vulneravéis às chuvas tropicais, à penúria de água, ao calor, aos cheiros, à falta de higiene, às imundicíes, o desprezo, caos, à anarquia.
Comprometendo-se Aristide a realizar uma revolução social, afirmando que antes houve apenas uma independência nominal. Porém 08 meses depois, foi deposto por um novo golpe militar planeado pelo general Cédras que Aristide nomeara para a chefia do Estado-Maior e mais tarde como comandante-chefe do Exército. E a ditadura restaura-se no Ayiti.

Em 1994, apoiado pelo Estados Unidos da América, Aristide reassume o país com a economia destroçada pelas convulsões internas, mesmo assim, o ciclo de violência, corrupção e miséria não é rompido.

Os protestos contra Aristide, em janeiro de 2004, fizeram várias mortes em Porto Príncipe, capital de Ayiti. Em fevereiro de 2004, surgiram conflitos armados em Gonaives, espalhando-se pelas outras cidades. Gradualmente, os rebeldes assumiram o controle do norte do Ayiti. Com o avanço destes rebeldes, o antigo presidente, em 29 de Fevereiro, asila na África do Sul e o Ayiti sofre intervenção internacional pela ONU.

Nesse sentido, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou o envio da Força Multinacional Interina, liderada pelo Brasil. Todavia, “considerando que a situação no Ayiti ainda constituía ameaça para a paz internacional e a segurança na região”, o Conselho de Segurança decidiu estabelecer a Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Ayiti (minustah), que assumiu a autoridade exercida anteriormente pela Força Multinacional Interina, em 1 de Junho de de 2004, igualmente comandada pelo Brasil.

Missão que sempre foi combatida pelos ayitianos que a considera um braço do domínio imperialista na América latina, tendo a situação do país piorado após a ocupação das tropas minustah. Procurando garantir apenas a segurança das empresas multinacionais instaladas no país, que exploram brutalmente a mão-de-obra barata (escravos modernos), produzindo para os estados unidos a custos mínimos como na China e Bangladesh. "As tropas não estão cumprindo ajudas humanitárias", pelo contrário reprimem as lutas do povo, assassinam aytianos e estupram mulheres. "A ocupação militar e o plano económico" reduziu Ayti novamente a uma colónia. Saiba mais em www.scribd.com/doc/20850531/null.

Actualmente a economia de Ayiti encontra-se destroçada e em ruínas. O povo sofreu a perversidade de seus dirigentes tanto quanto sofrera a da colonização. Uma pequena minoria inspirou-se nos espanhóis, franceses, ingleses, americanos para perenizar a escravidão sob outras formas. Expulsou-se o mau senhor, mas aprendera-se com ele a pilhar, a roubar, a explorar, a reproduzir a dominação.

A outrora “pérola das Antilhas” que motivara os espanhóis, franceses, ingleses e americanos a explorarem seres humanos, com a captura de milhares de crianças, mulheres e homens da nossa ancestral mãe África para trabalharem nas plantações, é hoje a devastada Ayiti, que a 12 de Janeiro de 2010 foi surpreendida por um terremoto de proporções catastróficas, que alguns dizem merecido pelos séculos de adoração ao diabo, referindo-se ao Vodu (o deus da resistência negra, que assim como o criollo são as raízes do Ayiti, sendo o hougan, sacerdote vodu, um sacerdote completo que canaliza, orienta, revigora e vivifica a fé comunitária), e outros vêem como uma oportunidade para desenvolver a economia interna, conservar o poder e reconhecimento internacional por ditas “ajudas humanitárias” concedidas ao Ayiti.

Os ayitianos sobreviventes são obviamente, pelo seu percurso, um dos povos materialmente mais pobres do mundo, tal-qualmente, como genuíno africano, os mais corajosos da terra, que não se resigna, sempre fiel à Cultura e aos valores da Liberdade, por isso achará o Nia (Caminho, próposito) para continuar a labuta pela própria sobrevivência.

Avante Ayiti, para ti e todos os africanos (dentro e fora da mãe Alkebulan), ainda,
A LUTA CONTINUA.

Abenaa.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

“A LUTA CONTINUA”

No dia 23 de janeiro de 1963, o Secretário Geral do PAIGC (Partido Africano Independente da Guiné e Cabo Verde), Amílcar Cabral, deu início a luta armada contra os colonizadores portugueses. Uma luta pela causa da Justiça e o Direito dos povos da Guiné-Bissau e das Ilhas de Cabo Verde, de governarem suas terras como homens livres, com liberdade de pensar, de criar e caminhar com dignidade enquanto africanos. Uma luta que deu continuidade à nossa história, que foi interrompida pelos imperialistas, de nos desenvolver como uma nação livre e autônoma, contruindo uma nova vida. Uma luta pela qual o objetivo essencial foi a realização das aspirações à liberdade, à paz, ao progresso e a justiça social dos povos africanos.

Hoje, 23 de janeiro de 2010, 47 anos depois do dia em que se iniciou a luta armada, ficam algumas questões de reflexão para os nossos irmãos e irmãs africanos analisarem e consignarem em si mesmo a verdadeira importância do que foi o movimento de libertação nacional do PAIGC e repensar as nossas ações afim de redefinir o rumo em que estamos levando o futuro dos nossos povos. Um futuro que, a meu ver, caminha para o sentido oposto da história da construção do nosso Estado Independente. Unidade, Trabalho e Progresso.

Será que Amílcar Cabral lutou em vão? Qual foi a importância de uma luta armada na nossa história? Como hoje vemos e encaramos esse fato (luta armada) com a realidade presente do nosso País e do nosso Continente Africano?

A luta armada foi uma reação, uma resposta à violência, à brutalidade da opressão colonial e neocolonial. Ela não abrange somente a integridade física e territorial como também, a integridade psíquica e intelectual. Foi uma combinação de teoria e prática revolucionária para defender o nosso povo de um domínio estrangeiro, uma forma dolorosa, mas eficaz de continuarmos com o progresso do nosso povo. Mas antes, de falar da luta armada do PAIGC, é importande relembrar o que foi a colonialização e o que é a neocolonialização para que entendamos as questões já mencionadas e quais são os seus efeitos sobre nós africanos hoje.

No que se refere aos efeitos da dominação imperialista sobre a estrutura social e o processo histórico dos nossos povos, convém averiguar em primeiro lugar quais as formas gerais de dominação, do imperialismo. Elas são pelo menos duas:
1)Dominação direta – por meio de um poder político integrado por agentes estrangeiros ao povo dominado (forças armadas, polícia, agentes da administração e colonos) – à qual se convencionou chamar colonialismo clássico ou colonialismo.
2)Dominação indireta – por meio dum poder político integrado na sua maioria ou na totalidade por agentes nativos – à qual se convencionou chamar de neocolonialismo.”
Arma da teoria, Amílcar Cabral, pag. 31 a 32.

A dominação direta, sabemos que perdurou no mínimo quatro séculos, ou seja, quatrocentos anos sob o comando da igreja católica alegando que os africanos são pagãos e que precisam ser salvos por eles, tendo como base uma ideologia diabólica, racista, cruel e desumana. Construíram o imperialismo com o sangue dos nossos ancestrais, destruíram a nossa cultura, impediram-nos ao progresso e submeteram-nos ao regresso enquanto seres humanos. Esta dominação, a que Amílcar Cabral chamou de colonialismo clássico, não foi só uma forma que usaram para oprimir o nosso povo, foi também uma forma que adotaram para construir e perpetuar o seu domínio facista sobre toda a Terra. Hoje, todos sabemos e compreendemos que as grandes potências foram construídas com grandes sofrimentos, massacres e derrame de sangue, mas é incompreensível como poderíamos nós, descendentes dos oprimidos, continuar nas suas cidades, seus impérios, como se nada tivesse acontecido! Ainda sinto o cheiro de sangue quando caminho nas ruas e praças das suas cidades, as marcas dos nossos ancestrais estão por todos os lados, nos museus, nos arquivos históricos e até mesmo nos cemitérios onde existe a presença dessa dominação, por inúmeros lugares onde existiu a segregação, lugares que são frequentados por brancos separados dos negros, até mesmo em Cabo Verde temos essa prova com o cemitério de brancos e pretos na ilha do Fogo. Não há como não ver isso, mas a grande maioria infelizmente não tem essa percepção com frequência.

Essa falta de consciência foi embutida no nosso povo sistematicamente, planejada e calculada, através do neocolonialismo, o que Amílcar Cabral chamou de dominação indireta, em que eles passam a pseudo-independência para o nativo, continuando com o seu regime opressor e facista numa outra escala de domínio. São várias as teorias racistas que eles inventaram para justificar a escravatura e através destas fundaram as suas sociedades e construíram suas cidades nos usando como força produtiva e em troca nos segregaram dos seus planos sociais, culturais e econômicos. Veja algumas teorias racistas defendidas por eles, tendo-as como base da construção das suas sociedades:

O Rev. Thomas thompson publicou em 1772 uma monografia onde procurou demonstrar a inferioridade do negro diante do brando, intitulada: O Comércio dos Escravos Negros na Costa da África de acordo com os Princípios Humanos e com as Leis Religiosas Reveladas.”
Em 1852, o Rev. J.Priest, conhecido etnógrafo e fundador da Sociedade Antropológica de Londres, publicou em tratado denominado A Bíblia defende a Escravidão, onde é a favor desta, usando uma suposta argumentação biblica favorável, na realidade falsa.
Em 1900, C.Carrol em sua obra Provas Bíblicas e Científicas de que o Negro não é Membro de uma Raça Humana, afirma que todas as pesquisas científicas confirmam sua natureza caracteristicamente símia
.” Superando o Racismo na Escola, Kabengele Munanga – organizador, pag. 48.

Assim permanece as suas normas até hoje, a escravatura sempre existiu e ainda existe, mas não é percebida pelo povo. O neocolonializado. Por isso uma luta armada foi necessária e continua sendo necessário lutar também nesta batalha, para não acabarmos oprimidos por tempos maiores do que já fomos. A luta armada foi um instrumento de unificação, assim como foi um instrumento de progresso cultural, afirma Amílcar Cabral, que reuniu as massas em um único movimento de libertação e em uma única ideologia, A libertação nacional total. A importância da luta armada, além de nos garantir segurança, paz e a integridade física foi, sem dúvida, a consciência ideológica benéfica e louvada de ser compreendida e vivida eternamente em cada africano honesto. A luta exigiu a mobilização e a organização de uma massa significativa da população das diversas categorias sociais à unidade política e moral que hoje não se fala muito ou se fala, mas não se põe em prática.

Se aliarmos a estes fatos, inerentes a uma luta armada de libertação, a prática da democracia, da crítica e da autocrítica, a responsabilidade crescente da população na gestão da sua vida, a alfabetização, a criação de escola e de assistência sanitária, a formação de quadros originários dos meios rurais e operários – assim como outras realizações – veremos que a luta armada de libertação é não apenas um fato cultural mas também um fator de cultura. Essa é, sem dúvida alguma, para o povo, a primeira compensação aos esforços e sacrifícios que são o preço da guerra. Perante esta perspectiva, compete ao movimento de libertação definir claramente os objetivos da resistência cultural, parte integrante e determinante da luta.” Arma da teoria, A. Cabral, pag. 69 a70.

Numa perspectiva coletiva, a impressão que se tem hoje sobre a repercurssão da luta armada no nosso povo é que ela abriu-nos o caminho para a libertação nacional na totalidade, mas não foi efetivamente alcançada, porque o povo não beneficia com o “Estado Independente” , liberdade equitária. As normas da sociedade africanas continuam com os alicerces sobre uma constituição opressora, onde poucos tem de tudo em abundância e muitos nada possuem, na miséria. Esses estados independentes (Guiné e Cabo Verde) não foi capaz de manter a promessa de uma liberdade total sem o seu maior protagonista, o Secretário Geral Amílcar Cabral. O estado independente foi incapaz de continuar com a política revolucionária do PAIGC, porém é capaz de nos passar uma falsa ilusão do desenvolvimento e progresso financeirol. No entanto, na perspectiva individual, a luta de Amílcar Cabral foi e continua sendo uma fonte de inspiração para os retos no pensamento e justos na ação, de uma riqueza intangível, incapaz de ser expressa na totalidade por esse meio. Nos poucos que ainda dão real importância a essa luta, existe neles uma consciência revolucionária, uma luta individual comun as aspirações do nosso povo africano. Assim como Amílcar Cabral afirmou nos tempos passados, hoje cumpre-se rigorosamente palavra por palavra, de que a batalha é diferente à de 47 anos atrás, o inimigo pode ser qualquer pessoa com espírito de colono e a arma para enfrentar esta batalha é o conhecimento matématico e tecnologico.

Que esse dia fique na mente dos patriotas como um dia em que devemos renovar as nossas esperanças, pois o próprio Amílcar Cabral sempre mostrava essa esperança nos povos e assim viveu até os seus últimos dias em que esteve conosco fisícamente porque acreditava no destino da África, Alkebu-Lan. Cabral Vive!

Deixo esse discurso do Secretátio Geral, Amílcar Cabral, em Addis-Abeba, Etiópia, em abril de 1971 na Oitava Conferência dos Chefes de Estado de Governos da Organização da Unidade Africana (OUA): “Há pessoas ou combatentes que desesperam, mas os povos nunca desesperam. É necessário confiar nos povos e nós combatentes da liberdade africana, nós que estamos prontos para morrer e vimos camaradas tombar ao nosso lado, nós não temos qualquer razão para não acreditar no destino da África, na capacidade de qualquer que seja o povo africano de se libertar totalmente do jugo colonial e racista e de tomar nas suas mãos o seu destino, como vós próprios o fizestes.” A Arma da teoria, Amilcar Cabral, pag. 11.

Por Vadinho. Uma contribuição de www.Khemsvibes.wordpress.com

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Um pouco sobre a musicalidade de Cabo Verde

Esclarece o antropólogo caboverdiano João Lopes Filho, no seu livro “Introdução à Cultura Cabo Verdiana”, editado pelo antigo Instituto Superior de Educação de Cabo Verde, que a música Caboverdiana é de “melopeia bantu”, ou seja, de origem essecialmente africana.

Como o surgimento da sua população, os instrumentos musicais caboverdianos foram introduzidos em Cabo Verde com o tráfico de escravos, pelos próprios africanos escravizados.

A Cimbó ou Cimboa, uma espécie de rabeca, cujo termo, segundo o referido João Lopes citando António Carreira, é de origem mandinga. Mais diz João, que corroboramos, este instrumento musical preciso ser preservado para não desaparecer. Poucos o conhecem em Cabo Verde e menos ainda o sabem tocar. Diz-nos João que actualmente existe apenas na ilha de Santiago, mas já foi presente em Sto. Antão, S. Nicolau, Fogo e Maio, sendo estas as primeiras ilhas de Cabo Verde a serem povoadas. A Cimboa é normalmente utilizada nas festas da tabanca e no batuque.

Utilizou-se também em Cabo Verde o tambor africano, o Tam-Tam, mas a igreja proibiu o seu uso e substituiu-o pelo tamboril e o tambor português, ambos bimembrafones. O tambor africano desapareceu muito cedo de Cabo Verde. Entretanto, sempre é possível o seu resgate para a preservação, divulgação e manutenção da nossa história, cultura e identidade africana.

Coabitou no ambiente musical, violinos, violões, cavaquinho e bandolim (banjo). O banjo, igualmente, já quase não se usa. Jogo de maracás (chocalho), viola de 10 cordas (5 cordas duplas). Clarinete, trompete, tocados na Morna acústica.
*
As Cantigas de guarda-de-sementeiras, resultado de um meio rural tradicional, caracterizada pela existência ancestral e pela sua função utilitária, ligada ao exercício da actividade agrícola em condições de permanente desafio à natureza (cultura de sequeiro, donde provém o milho e o feijão). A escassez da chuva que causava perdas de sementeiras, e a necessidade de guardar a sementeira evitando corvos, parvais e galinhas-de-mato, determinara o surgimento das cantigas de guarda-de-sementeira, sendo eles as suas personagens.

As Cantigas de curral-de-trapiche, também conhecidas por “cóla-boi” ou “aboios”, surgem com a introdução da cana-de-açúcar em Cabo Verde. Em substituição dos animais de tracção era utilizada a força física do escravo africano nos primeiros engenhos de açúcar, assim, surgindo estas cantigas da “bestialização”, brutificação, destes escravos.

Em situações idênticas de trabalho escravo, surgiram as Cantigas de mondadores, na época da monda (sementeiras), que são designadas de bombena.

Fazem ainda parte da música e dança caboverdiana, a morna, na epóca considerada pelos moradores brancos de Cabo Verde “batuque que agora tocam por aí e que não permite às pessoas dormir”, a coladeira, o batuque - com finaçon e o funaná tendo como lugar próprio o «terrero» - e a mencionada tabanca (peregrinação dançante) de ascendência africana.

(...)
Abenaa.